Árvore - Ser

quinta-feira, novembro 21, 2013



Compartilho neste post um texto publicado na Revista Bons Fluídos, Editora Abril, de autoria de Carlos Solano, que é Arquiteto, escritor, coordenador da campanha "Vamos Plantar Um Milhão de Árvores", e também pesquisador devotado da cultura popular e seus segredos de proteção da "casa", além de transitar pela ecologia, filosofia, poesia, Feng Shui com o intuito de fornecer indicações práticas que possam melhorar a qualidade de vida em geral. Com todas estas qualidades Carlos ainda tem um sorriso franco e escreve com o coração. E como tudo o que é bom é compartilhado no "nosso Jardim"... Trago aqui para vocês, Carlos Solano com seu texto:

Árvorecer, Árvore-Ser

Pois me contava seu Antonio, no meio daquele quintalzão, no meio de latas e latinhas plantadas, cheias de cheiros e segredos, no meio de um bom caneco de café passadinho na hora: _ "De tudo, o que vale mais é se arvorecer". Pausa. Arvorecer? O que será isso, meu Deus? Encabulado, e sem querer ofender, me propus discretamente a investigar. E levei a conversa para o lado mais evidente: o das árvores e das madeiras. _ "A madeira é viva", me respondeu. _"Só por isto, já merece um afeto". Uma misturinha de cera de abelha, carnaúba e parafina, evita o ressecamento, que favorece as pragas. A cera de abelha, que ainda perfuma, imuniza por causa da própolis e, é boa para os móveis. O barro da terra de formigueiro e a fumaça do fogo à lenha também a protegem. Por causa do fogo, Seu Antonio jura que "em casa de mulher não entra cupim". Contra umidade, ele usa sebo animal ou qualquer azeite - de mamona, de dendê. Para a madeira que toma sol e chuva, o óleo de linhaça é um verniz natural, e ainda estimula a cor. Para clarear o assoalho, esfrega-se a folha da piteira, batida e rasgada, junto com a areia do rio. _"Mas, o mais importante é colher a madeira madurinha (para não ser ofendida pelas pragas), na lua minguante (para recolher o fortificante) e nos meses sem R, de maio a agosto (seca, para não empenar)". _Mas podemos usar madeira em casa sem culpa? Cortar árvore não ofende as matas? Levei a conversa adiante, tateando pelos caminhos do "arvorecer". _"Depende", disse ele. "Árvore se planta, árvore cresce". Claro, a madeira é o único material renovável... Uma montanha de areia, uma mina de calcáreo ou de minério de ferro - elementos tecidos pela Natureza ao longo de milênios - não se recuperam jamais. Mas a madeira deve ser certificada com um selo ambiental, que garante o manejo ecológico e a salvação das matas. Confirmam as barbas brancas do Seu Antonio que, se replantarmos, "quando o neto estiver morando na casa que foi da avó, o mato já está refeito".


Uma luz! Quem sabe "arvorecer" não tem haver com "deixar florescer", "defender", ou "manter" as matas? Afinal, faz sentido. A árvore é um dos três componentes fundamentais do entorno humano. Os outros são a pessoa e a casa. Diz o maravilhoso Livro das Árvores (OGPTB), que "a floresta é a maior riqueza que podemos deixar para nossos filhos". Sim, deve ser isso! Mesmo porque, hoje, as árvores são os protetores da Terra: impedem a erosão (a destruição do solo e mananciais), perfumam e purificam o ar (retendo as partículas poluentes), doam frutos, servem de habitat para animais e pássaros, equilibram o processo de aquecimento global (absorvem dióxido de carbono e devolvem à atmosfera vapor d'água e oxigênio). As árvores ainda nos favorecem criando lugares de estar (sob uma copa frondosa), de passear (numa alameda), de passar (num portal), de proteção (uma cerca), de beleza (o que é fundamental, pois o feio destrói a sensibilidade). Criando lugares de viver, as árvores também cativam os homens que, por sua vez, voltam a amá-las. Então num fôlego de coragem, concluí em alto e bom tom: Acho muito importante arvorecer as árvores! _"Como assim"?, foi a resposta. _"Arvorecer é arvorejar". Diante da minha perplexidade, ele se compadeceu: "Al-vo-re-cer ou al-vo-re-jar. Alvejar, tornar alvo, amaciar, abrandar, embrandecer o coração empedernido. Isso vale mais do que tudo". Vale mesmo. Mas cá para mim, arvorecer ainda tem - e sempre terá - tudo haver com árvore. Arvorecer é "árvore-ser". Pois não precisamos "arvore-ser"o coração e parar com esta mania de dominar a Natureza? Não precisamos plantar mais árvores - seja em vasos, no jardim, na calçada ou no sítio - como um ato a favor da vida? "Árvore-ser" é saber que vivemos em uma árvore, ou no único país do mundo que tem um nome de árvore" "Pau Brasil". "Árvore-ser" é vestir o verde da nossa e de todas as bandeiras. Pois não é que arvorecer é mesmo tudo o que precisamos? Estão aí os cabelos e as barbas brancas do Seu Antônio para comprovar.


Neste texto, Carlos Solano nos mostra através da simplicidade do "Seu Antonio" a riqueza contida na sabedoria popular que faz parte da nossa cultura existente em códigos e valores locais. Composta por lembranças e símbolos que se entrelaçam na relação afetiva com o lugar onde vivem, pessoas como o "Seu Antonio", criam no seus cotidianos, condições para que saberes ricos em significações sejam tecidos através das lutas e sonhos individuais de cada um. Assim, "Árvore-ser", é como um sonho que  primeiro deve surgir no coração para depois acontecer...

E aí, que tal Árvore-Ser?

Beijo no Coração!

Imagens: web/google



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"Eu agradeço pelas inúmeras vezes que você me enxergou melhor do que eu sou... Pela capacidade de me olhar mais devagar... já que muita gente já me olhou depressa demais. Olhe devagar cada coisa. Aceita o desafio de ver o que a multidão não viu. Entre cascalhos disformes, estranhos diamantes sobrevivem solitários. É bom ter amigos. Eles são pontes que nos fazem chegar aos lugares mais distantes de nós mesmos. A beleza anda de braços dados com a simplicidade. Basta observar a lógica silenciosa que prevalece nos jardins."
(Pe. Fabio de Melo)